As Bruxas de Salem - a história real
Em 1692 começou uma caça à bruxas na vila de
Salem, Massachusets, nos Estados Unidos, que logo se espalhou pelas vilas
vizinhas. Centenas de de pessoas foram acusadas de feiitiçaria e vinte foram
executadas como bruxas. Os historiadores, contudo, esclareceram e apontaram as
verdadeiras razões dessa onda de terror na época da colonização norte-americana
no final do séc. 17.
Em 1600, um grupo de imigrantes ingleses
conhecidos como "puritanos" se estabeleceram em emMassachusets.
Desprezados em sua terra vieram para o Novo Mundo para poderem viver segundo os
seus princípios. Para esse grupo radical todo o bem viria de Deus e todo o mal
estaria ligado ao demônio; acreditava ainda, e temiam, em particular, as
bruxas. Segundo eles, estas agiam com, e sob, o demônio, que dominava até mesmo
pessoas irrepreensiveis da comunidade. Essa era uma época de muitas
superstições, poucos estudos e cultura limitada a poucas famílias e aos
ministros religiosos.
Em 1689, Samuel Parris, ministro anglicano, havia
se mudado para a aldeia de Salem com sua família e dois escravos, Tituba e
Jhon, um nativo índio. Em janeiro de 1692, a filha de Parris, Elizabeth Parris,
9 anos, conhecida como Betty, adoece. É a doença de Betty, o gatilho para a
"caça às bruxas" e posteriormente, os julgamentos e as execuções.
Levada ao médico, William Griggs, ele não consegue diagnosticar a doença em
Betty e sob pressão do pai, Samuel, aponta a bruxaria como causa do mal na
criança. Isto foi o suficiente para a histeria tomar conta da comunidade.
Pouco antes, um surto de varíola atacou as crianças
de Salem, e esta doença, para a crença da época, tinha origem demoníaca. Betty
e uma sobrinha dos Parris começaram a se comportar de forma estranha, com
convulsões, gritos e outras formas de histeria. Inquiridas, as meninas alegaram
influência dos escravos da família Tituba e de duas mendigas da Vila, Sara Good
e Sara Osborne. Estas, levadas diante dos magistrados da vila negaram qualquer
influência mas Tituba afirmou que estava dominada por um demônio. As três foram
então, levadas à prisão.
Estava plantada e crescia a semente da paranóia que
atingiu até pessoas respeitáveis como Martha Corey, participante fiel da igreja
local. Em 27 de maio de 1692, o governador William Phipps, ordenou a criação de
um Tribunal Especial para ouvir e decidir sobre esses casos, em Suffolk, Essex
e nos condados de Middlesex. Em 10 de junho de ano ocorreu o primeiro
enforcamento de uma acusada, uma pobre mulher promíscua e maledicente da
vila.
O contexto histórico desse drama mostra disputas
familiares de terras, interferência religiosa e intensa superstição. Inocentes
pagaram injustamente com suas vidas e outros tiveram seus nomes envolvidos sem
motivos reais.
Por fim, O reverendo Parris e sua família foram
forçados a se afastar de Salem em 1696, devido à pressão da comunidade e seu
Noyes filho morreu em plena insanidade mental. A religião puritana começou a
desvanecer-se e perdeu sua influência e credibilidade, como resultado direto
dos julgamentos e execuções. A partir daí, a sociedade colonial começou a
questionar as crenças ultrapassadas e supersticiosas dos puritanos, bem como de
outros grupos religiosos similares.
Restou uma frase de Mary East, injustamente
enforcada em 22 de setembro de 1692:
"Se for possível, que não se derrame mais
sangue inocente ... Eu estou limpa deste pecado".
As feiticeiras de Salem
Há três
séculos, o vilarejo de Salem, na colônia americana da Nova Inglaterra, foi
tomado de assalto por uma onda de intolerância e de fanatismo religioso,
vitimando quase vinte pessoas. Esse infeliz incidente, e a caça às feiticeiras
que então se desencadeou, serviu como um alerta para que os princípios de
liberdade religiosa fossem assegurados na história dos Estados Unidos.
Salem é
visitada por Satanás
"É uma certeza que o demônio apresenta-se por vezes na forma de
pessoas não apenas inocentes, mas também muito virtuosas."
Mister
Parris, o pobre reverendo de Salem, estava exasperado. Betty, a sua única filha
de apenas nove anos, acometida por uma série de estranhos espasmos, jogou-se
petrificada sobre o leito, negando-se a comer. Naquela perdida cidadezinha, ao
norte de Boston, não existiam muitos recursos além de um velho médico que por
lá se perdera. Chamado para diagnosticar a doença, atestou para o aterrado pai
que a menina estava era enfeitiçada e que nada lhes restava a fazer além de uma
boa e sincera reza. A conclusão do doutor correu de boca em boca e em pouco
tempo os pacatos habitantes do pequeno porto tomaram conhecimento de que
Satanás resolvera coabitar com eles.
Simultaneamente
outras garotas, as amiguinhas de Betty, começaram a apresentar sintomas
semelhantes aos da filha do clérigo. Rolavam pelo chão, imprecavam, salivavam,
grunhiam e latiam. Foi um pandemônio. Pressionado a tomar medidas,
Parrisresolveu chamar um exorcista, um caçador de feiticeiras, que prontamente
começou sua investigação.
No século
XVII, poucos punham em dúvida a existência de bruxas ou de feiticeiras porque
uma das máximas daqueles tempos é de que "é uma política do Diabo
persuadir-nos que não há nenhum Diabo".
A
inquisição
Inquiridas
por CottonMather, que iria se revelar uma espécie de Torquermada americano, as
garotas contaram que o que havia desencadeado aquela desordem toda fora uns
rituais de vodu que elas viram Tituba fazer. Essa era uma escrava negra que
viera das Índias Ocidentais, e que iniciara algumas delas no conhecimento da
magia negra. Durante o último longo inverno da Nova Inglaterra, ela apresentara
várias vezes os feitiços para uma platéia de garotas impressionáveis. Educadas
no estreito moralismo calvinista e no ódio ao sexo que o puritanismo devota,
aquele cerimonial animista deve ter despertado as fantasias eróticas nelas.
Provavelmente culpadas por terem cedido à libido ou apavoradas por sonhos
eróticos, as garotas entraram em choque histérico. Seja como for o caso,
merecia ser ouvido num tribunal. Toda a Salem se fez então presente no salão
comunitário.
O
tribunal
Quando
colocadas num tribunal especial, presidido pelo juiz S. Sewall, e inquiridas
pelos juízes Corwin e Hathorne, as meninas começaram a apontar indistintamente
para várias pessoas que estavam na sala apenas como curiosas. O depoimento mais
sensacional foi o da escrava Tituba, que não só confessou suas estranhas
práticas como afirmou que várias outras pessoas da comunidade também o faziam.
A partir
daquele momento, a cidadezinha que já estava sob forte tensão se transformou.
Um comportamento obsessivo
tomou
conta dos moradores. Uma onda de acusações devastou o lugarejo. Vizinhos se
denunciavam, maridos suspeitavam das suas mulheres e vice-versa, amigos de
longa data viravam inimigos. Praticamente ninguém escapou de passar por
suspeito, de ser um possível agente do demônio. Não demorou para que mais de
300 pessoas fossem acusadas de práticas infames. O tribunal que entrou em
função em junho de 1692 somente parou em outubro. Resultou que dezenove pessoas
foram enforcadas.
A luta contra a bruxaria
Apesar de
existirem disposições papais que datam do século XV, como a Summisdesiderantesaffectibus, de
Inocêncio VIII, e o volumoso tratado dos dominicanos (o MalleusMaleficarum, de 1486), que orientavam na luta contra a
bruxaria, o mundo anglo-saxão aderiu a ela muito mais tarde. Na Inglaterra, os
procedimentos jurídicos antifeitiçaria somente foram fixados em 1664, com os SuffolkAssizes, de sir MathewHale,
mas nunca chegaram às trágicas dimensões que a caça às bruxas dos países
católicos. A explicação para isso deve-se a que não existia entre os
protestantes uma instituição tão poderosa como a Igreja Católica, que via na
heresia a marca da subversão. Também não parece acertado o argumento de Rossell
Hope Robbins, autor da Encyclopediaofwitchcraftanddemonology,
(Enciclopédia de feitiçaria e demonologia), de 1959, de que a caça às bruxas,
"nunca foi do povo", mas sim um hábil instrumento de padres e
advogados para enriquecer por meio do seqüestro dos bens dos denunciados.
O povo e
a bruxaria
É certo
que feitiços e envolvimentos com bruxas se perdem nos tempos imemoriais da
humanidade, mas somente no século XV é que passou a ser considerado herético.
Não parece ser possível acreditar que tal sentimento não correspondesse aos
anseios mais profundos do povo, às fobias tenebrosas do homem comum. Keith
Thomas, no seu monumental Religião e o
declínio da magia, refuta existirem interesses econômicos nas
perseguições, eis que a maioria das vítimas das caçadas era extremamente pobre,
o que George Tindall confirma no seu capítulo sobre os acontecimentos de Salem.
É
inquestionável que o povo acreditava sinceramente no maleficium, isto é, no dano causado pelas bruxas. Por um ou
outro motivo, ele acumpliciava-se com as autoridades nas medidas tomadas para
persegui-las e julgá-las. Na sociedade pré-iluminista, a existência do demônio
era coletivamente aceita porque servia como uma explicação conveniente para
acontecimentos estranhos, para as agressões injustificadas ao que lhes parecia
inusitado, ao inesperado. Por outro lado, socorrer-se de feiticeiras e de
bruxas sempre foi uma maneira de tentar influenciar pessoas ou coisas sobre as
quais se tinha escasso poder.
A
tentação do anonimato
É uma tentação
irresistível poder fazer o mal a alguém sem correr riscos de ser descoberto.
Arma do impotente, do covarde ou do fraco, o feitiço era uma maneira astuta de
causar prejuízos a alguém odiado. A vítima, por sua vez, não tinha a mínima
prova do que ou quem a mandou atingir. O malefício lançado contra alguém atuava
igualmente como um poderoso instrumento de compensação psíquica largamente
recorrido pelos desgraçados da vida. É uma forma, ainda que bem primitiva, de
se alcançar a justiça. Os atos mágicos ou as seções endemoniadas, por sua vez,
agem como anestesia aos padecimentos sofridos. De alguma forma, a possibilidade
de ser atingido por um feitiço qualquer atua como um fator dissuasivo entre os
poderosos. Um mandão, um prepotente, um déspota, poderia temer ser atingido por
um "mau olhado" ou cair vitimado por poção encantada qualquer. Afinal
eram as únicas coisas que os poderiam atemorizar, já que a justiça comum e
mesmo Deus pareciam sempre estar do seu lado.
Os céticos frente à bruxaria
É sintomático esse medo das
elites aos possíveis efeitos da bruxaria. O fato de que no influente Grande
Catecismo do jesuíta Pedro Canísio, editado no século XVI, o nome de Satã
aparecer 67 vezes, bem superior às dedicadas a Jesus. Mas deve-se a essas mesmas
elites porém um freio às perseguições. Montaigne nos ensaios, de 1580, já
ridicularizava esse tipo de coisa e na Inglaterra observou-se um número
crescente de juízes que começaram a desconsiderar as sucessivas denúncias de
bruxarias que chegavam às cortes, apesar de a legislação contra aquelas
práticas só ter sido revogada em 1736. A perda do medo às bruxas também pode
ser creditada à crescente expansão das luzes, aos avanços da razão, da educação
e da lógica científica que culminaram na máxima "se não há diabo, não há
Deus."
O fim da caçada
Deteve-se
a matança em Salem quando as denúncias envolveram figuras eminentes da colônia,
tal como a esposa do governador de Massachusetts e o pastor Samuel Willard,
presidente do Harvard College. Enquanto a arraia-miúda foi enclausurada,
acusada de práticas escusas, poucos se indignaram. O basta naquilo tudo foi
dado quando os dedos dos fanáticos ousaram apontar para a elite local. Ainda em
oito de outubro de 1692, circulou uma carta redigida por um intelectual da região,
Thomas Brattle, que se horrorizara com os enforcamentos, revelando a loucura
coletiva que tomara conta dos aldeãos. Segundo Perry Miller, que estudou as
idéias que circulavam pelas colônias americanas daquele século, a letterde Brattle teria sido o primeiro
documento iluminista produzido na América do Norte, pois criticou veementemente
os prejuízos do fanatismo religioso. Entre outras coisas, Battle escreveu:
"temo que os anos não apagarão essa desgraça, esta nódoa que essas coisas
lançaram sobre nossa terra." E os processos dos endemoniados de Salem
assim como começaram, num repente terminaram.
O macartismo
As
perseguições às bruxas de Salem serviram, dois séculos e meio depois, como tema
para que o teatrólogo Arthur Miller - sofrendo as intimidações feitas pelo
Comitê de Atividades Anti-Americanas do senador MacCarthy -, escrevesse a peça The Crucible (traduzida por nós como As bruxas de Salem). Encenada no
início dos anos de 1950, eram evidentes as analogias que Miller fez entre os
padecimentos da esquerda americana na época da Guerra Fria, com os tormentos
sofridos pelos injustamente acusados em Salem.
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